Otávio Nunes
“Com a filha de João, Antonio ia se casar. Mas Pedro fugiu com a noiva, na hora de ir pro altar.” A música invadia todo o quarteirão da rua enfeitada de bandeirolas coloridas. A fogueira ardia, estralava e as pessoas se divertiam naquele bairro, como em todos os meses de junho.
Enquanto comia uma espiga de milho assado e bebia quentão, Calcídio procurava avidamente descobrir o vulto de Glorineide entre as pessoas. Nervoso, sem saber se ela iria aparecer e topar levar adiante o plano traçado havia dois dias, o rapaz chegou até a se engasgar com um pedaço de gengibre do quentão. Cuspiu no chão a bebida e também diversos caroços de milho, até desobstruir a garganta. Minutos depois, enxergou Glorineide.
- E então. Está pronta pra gente ir embora?
- Não sei, Cal. Meu filho está resfriado e nem trouxe ele aqui na festa. Deixei dormindo em casa.
Calcídio insistiu. Disse que aquele era o momento certo. Tinha arrumado um táxi, que os esperava na esquina para levá-los à rodoviária. Até passagem comprada ele guardava no bolso.
- Temos de ir embora agora. Antes que seu marido chegue do trabalho.
Conversou, pediu, clamou, rezou. Até que ela concordou e foi pegar o filho, embrulhado num cobertor, e sua mala de roupas. Os três saíram rumo ao táxi, sem ninguém ver. Todos estavam de olho na fogueira que ardia na escuridão. Duas quadras depois, o pneu do táxi furou.
Enquanto o motorista e Calcídio trocavam o pneu, Glorineide e o garoto tiritavam de frio naquela noite de 29 de junho. De repente, surge o marido de Glorineide, que tinha descido do ônibus havia pouco, e perguntou o que estava acontecendo.
- Oh querido. Nosso filho não está bem e o Calcídio arrumou um táxi pra gente ir ao hospital. Não deu tempo de te esperar. Mas, agora, furou o pneu do carro....
O marido perguntou se tinha comida em casa e ela disse que sim. Agradeceu ao “meu grande amigo Calcídio” pela gentileza de levar o garoto e disse que iria para casa, pois estava cansado e com fome.
Tomou banho, procurou a comida e não encontrou. Então amaldiçoou a mulher. Comeu o pão amanhecido, uma banana e ligou a televisão para esperar por Glorineide e o menino.
Já se passaram outras festas juninas na rua. E ele continua a esperar e a comer bananas.
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