quarta-feira, 26 de março de 2008

Filho do outro

Otávio Nunes

Vivemos no país da picaretagem, da violência gratuita, da impunidade, da ausência e da inoperância do Estado em setores cruciais, da baixa instrução do povo, do mau gosto, da elite insensível, dos partidecos que viram moeda de troca... Chega. Já estou ficando piegas e demagogo. Digo isso do Brasil, para mostrar que há exemplos raros de nobreza de caráter ao ponto do altruísmo. Relatarei um caso assim, de um brasileiro benevolente. Até acho que é por causa de pessoas assim que ainda não nos destruímos como sociedade.

O golpe telefônico do falso seqüestro aterrorizou muita gente em São Paulo e outras capitais do nosso Sudeste. E lá se vão mais ou menos dois anos. Na época, meu chefe me incumbiu de fazer uma pauta sobre tão candente assunto. Lá fui eu entrevistar o delegado titular da Delegacia Anti-seqüestro, na Capital. Bastante solícito e educado, o policial mostrou ser ótimo entrevistado, pleno de informações e de histórias curiosas, algumas dramáticas, outras patéticas e até as divertidas.

Como gosto de historinhas, cá vai uma assaz interessante do delegado, cujo nome infelizmente esqueci. Incluí o fato na matéria, junto com outras duas historinhas sobre vítimas do golpe.

Triiiim!!! Catorze horas da tarde. Toca o telefone na casa de um senhor que vive só. Do outro lado da linha, uma voz alta e ameaçadora diz que seqüestrou o filho do homem e pede “trocentos real” de resgate. O dinheiro deve ser depositado em determinada conta de poupança em tal banco em até uma hora, no máximo. O homem anota tudo e se dirige ao banco.

Agora, um adendo. Por quê poupança? O delegado me disse que este tipo de conta é muito fácil de abrir em qualquer banco, por não exigir os mesmos cuidado e burocracia da conta corrente. Poupança não dá cheque, limite, nem permite saque a mais do que lá tem. Com documento falso é pá-pum – abriu a conta.

Pois bem, o homem depositou o dinheiro e voltou para casa aliviado. No entanto, ele só foi dar queixa na delegacia uma semana depois. Agora o curioso da história: o homem não tinha filhos.

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