Otávio Nunes
Somos o país dos folgados, para não dizer outra coisa. Vivemos cercados por eles. São tantos, que às vezes nós mesmos somos eles (Meu Deus, que frase esquisita, mas deve estar certa.) É político folgado, médico, advogado, pedreiro, cobrador de ônibus, banqueiro, bancário, empresário, peão, jornalista. Jornalista? Claro. Tem um monte. Ora este profissional é de carne e osso e tem os mesmo defeitos e virtudes que melhoram ou pioram qualquer mortal. Tem folgado, sim.
Pois bem, há coleguinhas nossos que, quando se vêm diante de algum problema particular e/ou doméstico, pedem ajuda às assessorias de imprensa. Vejamos: o nobre profissional da imprensa está com o telefone mudo, fio desencapado, torneira pingando, privada entupida, nome sujo na praça, perdeu a namorada para o dentista e outras atribulações da vida. Em vez de entrar em contato com serviço de atendimento ao consumidor, que realmente costuma ser ruim, prefere ligar direto para a assessoria de imprensa da empresa ou instituição em questão. Esta, para ficar de bem com a imprensa, costuma quebrar o galho do jornalista. Claro que há limites nesta troca de favores.
Estou há muitos anos fora deste meio, mas acredito que o costume ainda perpetue. Contarei aqui um caso destes que ocorreu comigo quando eu trabalhava na assessoria de imprensa de uma companhia telefônica, e lá se vai uma dezena de anos.
O telefone tocou e do outro lado uma moça se apresentou como repórter de um grande jornal paulistano e fez o seguinte pedido:
- Colega, bom dia. Tudo bem? Olha, infelizmente eu me esqueci de pagar a conta de telefone e a empresa me cortou a linha, sabe? Pois bem, esta semana faço aniversário e darei uma festinha, no sábado, para meus amigos no meu apartamento, na Vila Madalena. Por isso, gostaria que vocês me religassem o telefone na sexta-feira. No domingo, vocês podem cortar novamente. Dou minha palavra que semana que vem, quando receber do jornal, pago a conta. Aceito este favor como se fosse presente de aniversário. Tá bom, colega? Muito obrigada.
Desliguei o telefone sem saber se ria ou chorava. Levei o caso para meu chefe, um jornalista das antigas, daqueles bem gozadores. Assim que terminei o relato e lhe entreguei um papel com o nome da repórter, seu número de telefone em casa e no jornal, seu endereço e demais dados, ele teve uma crise de gargalhadas. Por vários segundos ele riu. Foi tamanha balbúrdia que atraiu a atenção de todo o andar. Eu, novo de emprego e estupefato, morria de vergonha. Depois, refeito da crise, ele me disse:
- Desculpe, companheiro. Mas é a história mais engraçada que já ouvi nesta assessoria. Não agüentei. Ri a bandeiras despregadas
Disse ele, que adorava usar frases literárias antigas, e completou
- Se esta fulana ligar de novo mande-a pra...
Voltei para minha mesa, ainda envergonhado, e continuei meu trabalho. Ela não voltou a ligar.
quinta-feira, 31 de julho de 2008
quarta-feira, 30 de julho de 2008
Ferrões e dentes
Otávio Nunes
A abelha entrou na padaria através da janela aberta e pousou mansamente sobre uma torta de morango. Uma freguesa, interessada no doce, pegou a revista que carregava e jogou no inseto, na tentativa de espantá-lo. Atordoada, a abelha caiu no balcão de vidro, zunindo e batendo as asas.
Uma amiga de sua colméia entrou no estabelecimento e enfiou o ferrão no braço da mulher. Ao ouvir os gritos, seu Manuel da Paixão, dono da padaria, aproximou-se e presenciou a freguesa esfregando os braços doloridos. Ao ver aqueles membros carnudos, queimados pelo sol, seu Manuel não teve dúvida. Deu uma mordida também.
A abelha entrou na padaria através da janela aberta e pousou mansamente sobre uma torta de morango. Uma freguesa, interessada no doce, pegou a revista que carregava e jogou no inseto, na tentativa de espantá-lo. Atordoada, a abelha caiu no balcão de vidro, zunindo e batendo as asas.
Uma amiga de sua colméia entrou no estabelecimento e enfiou o ferrão no braço da mulher. Ao ouvir os gritos, seu Manuel da Paixão, dono da padaria, aproximou-se e presenciou a freguesa esfregando os braços doloridos. Ao ver aqueles membros carnudos, queimados pelo sol, seu Manuel não teve dúvida. Deu uma mordida também.
sexta-feira, 25 de julho de 2008
Corpos ardentes
Otávio Nunes
(Roupa nova para uma piada velha)
- Querido, nossa relação é realmente transparente?
- Claro, meu amor. Não escondemos nada um do outro, seja o que for. Somos um casal moderno, como Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir.
- Pois bem. Fiquei sabendo que você saiu com a Robertinha. É verdade?
- Pô...caramb...é que...
- Sim ou não? Olhe a transparência.
- Sim. Desculpe meu amor. Eu...iria contar a você. Mas, você sabe, tenho trabalhado muito e ando meio esquecido. É verdade, embora não seja nada sério. É que não resisti àquele corpinho de ginasta romena que a Robertinha tem.
- Mais algum corpinho que você não resistiu?
- Ah, bem, eu...como vou dizzz...
- Somos um casal moderno, mon amour: Sartre e Beauvoir.
- É verdade. Teve também a Rosana...
- Eu desconfiava. Esta se atira aos homens como nadador na piscina.
- e a Consuelo, também, querida.
- Até ela? Com aquele jeito de madre superiora?
- E você, querida? Nunca encontrou um corpo que a desviasse da rotina?
- Só um.
- Qual?
- Lembra-se daquele “corpinho” de bombeiros perto da casa da minha mãe?
(Roupa nova para uma piada velha)
- Querido, nossa relação é realmente transparente?
- Claro, meu amor. Não escondemos nada um do outro, seja o que for. Somos um casal moderno, como Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir.
- Pois bem. Fiquei sabendo que você saiu com a Robertinha. É verdade?
- Pô...caramb...é que...
- Sim ou não? Olhe a transparência.
- Sim. Desculpe meu amor. Eu...iria contar a você. Mas, você sabe, tenho trabalhado muito e ando meio esquecido. É verdade, embora não seja nada sério. É que não resisti àquele corpinho de ginasta romena que a Robertinha tem.
- Mais algum corpinho que você não resistiu?
- Ah, bem, eu...como vou dizzz...
- Somos um casal moderno, mon amour: Sartre e Beauvoir.
- É verdade. Teve também a Rosana...
- Eu desconfiava. Esta se atira aos homens como nadador na piscina.
- e a Consuelo, também, querida.
- Até ela? Com aquele jeito de madre superiora?
- E você, querida? Nunca encontrou um corpo que a desviasse da rotina?
- Só um.
- Qual?
- Lembra-se daquele “corpinho” de bombeiros perto da casa da minha mãe?
quinta-feira, 24 de julho de 2008
O avião e o sonho
Otávio Nunes
Léio olha para cima no exato momento em que o focinho vermelho do avião surge no horizonte, acompanhado de seu barulho ensurdecedor e característico. Pensa o menino que aquele ronco forte dos motores é para amedrontar as nuvens e abri-las para o aparelho passar e exibir seu vôo perfeito como passos de dançarina.
Por estar longe, Léio acha que o aparelho voa lento, a planar. Seu coração de 13 anos palpita de alegria ao imaginar que um dia ele será piloto. Assiste a filmes em que o herói é piloto destemido. Apesar de todas as encrencas em que se mete, o mocinho sempre vence o vilão, conquista a mocinha sem ao menos sujar ou amassar seu uniforme azul marinho e tampouco deixar seu boné cair. Léio sonha pilotar avião com a mesma intensidade com que um médico deseja acabar com todas as doenças do mundo.
Fica com a cabeça levantada durante todo o trajeto daquele pássaro metálico. Acompanha o avião surgir num horizonte e desaparecer noutro, deixando a mesma sensação de vazio que ocorre no teatro quando a atriz sai do palco.
Seus amigos dizem que somente os ricos viajam e dirigem aviões. Gozam do menino sonhador. Mas Léio, forte como fuselagem, não se deixa amedrontar e segura firme as asas de seu desejo entre os dedos. Sabe que seus amigos da rua vão morrer de inveja quando ele estiver pilotando um a jato, daqueles gigantes. Talvez, imagina Léio, ele até coloque a mão fora e acene para seus amigos, lá de cima.
Não são apenas os meninos da vila a sabotar seu sonho. Seu pai pedreiro e sua mãe doméstica, também. “Deixe de olhar para cima, vai pegar torcicolo”, diz a mãe. “Pare de ser bobo, você tem que crescer para aprender uma profissão de gente, de homem”, berra o pai.
No dia em que completa quinze anos, o moleque, crescido e forte, é intimado pelo pai. Começa, então, a trabalhar nas obras que o pai constrói. Depois de algum tempo, por causa de tijolo por carregar, sai também da escola. Mesmo assim, entre um tijolo e outro, Léio ainda olha para cima na tentativa de ver outro avião. Aliás, sem saber motivo, os aviões estão se rareando a cada dia. Mas Léio procura por um no céu. Tem certeza que um dia estará lá em cima, de terno azul, sentado em frente aquele painel cheio de aparelhos, relógios, números e luzes. Gosta de olhar de para o céu porque sabe que se abaixar os olhos só verá as latas de concreto por carregar.
Léio olha para cima no exato momento em que o focinho vermelho do avião surge no horizonte, acompanhado de seu barulho ensurdecedor e característico. Pensa o menino que aquele ronco forte dos motores é para amedrontar as nuvens e abri-las para o aparelho passar e exibir seu vôo perfeito como passos de dançarina.
Por estar longe, Léio acha que o aparelho voa lento, a planar. Seu coração de 13 anos palpita de alegria ao imaginar que um dia ele será piloto. Assiste a filmes em que o herói é piloto destemido. Apesar de todas as encrencas em que se mete, o mocinho sempre vence o vilão, conquista a mocinha sem ao menos sujar ou amassar seu uniforme azul marinho e tampouco deixar seu boné cair. Léio sonha pilotar avião com a mesma intensidade com que um médico deseja acabar com todas as doenças do mundo.
Fica com a cabeça levantada durante todo o trajeto daquele pássaro metálico. Acompanha o avião surgir num horizonte e desaparecer noutro, deixando a mesma sensação de vazio que ocorre no teatro quando a atriz sai do palco.
Seus amigos dizem que somente os ricos viajam e dirigem aviões. Gozam do menino sonhador. Mas Léio, forte como fuselagem, não se deixa amedrontar e segura firme as asas de seu desejo entre os dedos. Sabe que seus amigos da rua vão morrer de inveja quando ele estiver pilotando um a jato, daqueles gigantes. Talvez, imagina Léio, ele até coloque a mão fora e acene para seus amigos, lá de cima.
Não são apenas os meninos da vila a sabotar seu sonho. Seu pai pedreiro e sua mãe doméstica, também. “Deixe de olhar para cima, vai pegar torcicolo”, diz a mãe. “Pare de ser bobo, você tem que crescer para aprender uma profissão de gente, de homem”, berra o pai.
No dia em que completa quinze anos, o moleque, crescido e forte, é intimado pelo pai. Começa, então, a trabalhar nas obras que o pai constrói. Depois de algum tempo, por causa de tijolo por carregar, sai também da escola. Mesmo assim, entre um tijolo e outro, Léio ainda olha para cima na tentativa de ver outro avião. Aliás, sem saber motivo, os aviões estão se rareando a cada dia. Mas Léio procura por um no céu. Tem certeza que um dia estará lá em cima, de terno azul, sentado em frente aquele painel cheio de aparelhos, relógios, números e luzes. Gosta de olhar de para o céu porque sabe que se abaixar os olhos só verá as latas de concreto por carregar.
quarta-feira, 23 de julho de 2008
Enviado especial
O nome do personagem é fictício, mas a história é verdadeira, verídica e ocorreu realmente, mesmo e no duro. Ocorreu na redação de um grande jornal paulista em 6 de setembro de 1972.
Otávio Nunes
Ornesto Josético, editor de esportes do famoso diário Verdade Seja Dita, escovava os dentes em seu apartamento em Pinheiros, quando ouviu a vinheta de notícia extraordinária no rádio, lá na cozinha. Saiu correndo do banheiro e foi para perto do aparelho, segurando a escova na boca e babando pasta de dente pelo chão.
-ATENÇÃO! Violento atentado terrorista na Vila Olímpica em Munique, na Alemanha Ocidental, mata 18 pessoas, entre elas 11 membros e atletas da delegação de Israel e cinco terroristas. Eles pertencem à facção palestina Setembro Negro e seqüestraram outros atletas judeus para exigir a liberdade de 230 presos políticos palestinos, presos em Israel. Atiradores de elite da polícia alemã ocidental abriram fogo contra o grupo terrorista no aeroporto de Munique. As autoridades suspenderam os jogos olímpicos hoje, em Munique. Assim que tivermos mais notícias, informaremos nossos ouvintes.
O jornalista, calejado por anos de batalha com a notícia, foi pego de surpresa, porém se recompôs. Bateu levemente na pança e disse para si mesmo. “Desgraça é horrível, mas costuma dar boa matéria. Nosso enviado especial já deve estar escrevendo uma senhora reportagem sobre este atentado.”
Na portaria, no elevador e na redação o papo era o mesmo. O atentado em Munique. Josético sentou-se à sua mesa e chamou sua equipe de redatores. “Macacada, não esquentem a cabeça com o atentado. Neste momento nosso enviado especial em Munique está escrevendo a matéria e logo logo receberemos pelo telex. Arrumem outro tipo de notícia e não me encham o saco. Falô?.”
O tempo foi passando. Três horas da tarde, cinco, seis, sete, oito da noite e a matéria não chegava. O diretor de redação saiu de seu aquário (sala), pedindo licença ao vereador que o visitava, reclamando de uma notícia publicada pelo jornal naquele dia, e dirigiu-se ao editor de esportes Ornesto Josético.
- E aí, meu chapa, já chegou a matéria?
- Inda não, chefe. Tô esperando.
- Não dá ligar pra este enviado especial? Perguntou novamente o diretor.
- As ligações para Munique estão complicadas. Quase nada na cidade deve estar funcionando direito. Só o serviço funerário, chefe.
O diretor não desistiu
- Pô, meu! Já tentou o celular e a Internet?
- Mas chefe, estas coisas ainda não foram inventadas. Estamos em 1972.
O diretor de redação voltou para continuar a ouvir o vereador reclamante.
Vinte minutos depois, um dos redatores retira um papel do telex e chama Ornesto Josético.
- Maravilha. Chegou nossa principal matéria do dia. Viva, viva. Esquentem as máquinas. Avisem o chefe, esbravejou Josético.
O renitente e otimista editor pegou rapidamente o papel. O texto se resumia a duas únicas linhas.
“Hoje não enviarei matérias sobre os jogos olímpicos de Munique. A competição foi cancelada por 24 horas por causa de um atentado terrorista." Assinado: Enviado especial, de Munique para o jornal Verdade Seja Dita.
Otávio Nunes
Ornesto Josético, editor de esportes do famoso diário Verdade Seja Dita, escovava os dentes em seu apartamento em Pinheiros, quando ouviu a vinheta de notícia extraordinária no rádio, lá na cozinha. Saiu correndo do banheiro e foi para perto do aparelho, segurando a escova na boca e babando pasta de dente pelo chão.
-ATENÇÃO! Violento atentado terrorista na Vila Olímpica em Munique, na Alemanha Ocidental, mata 18 pessoas, entre elas 11 membros e atletas da delegação de Israel e cinco terroristas. Eles pertencem à facção palestina Setembro Negro e seqüestraram outros atletas judeus para exigir a liberdade de 230 presos políticos palestinos, presos em Israel. Atiradores de elite da polícia alemã ocidental abriram fogo contra o grupo terrorista no aeroporto de Munique. As autoridades suspenderam os jogos olímpicos hoje, em Munique. Assim que tivermos mais notícias, informaremos nossos ouvintes.
O jornalista, calejado por anos de batalha com a notícia, foi pego de surpresa, porém se recompôs. Bateu levemente na pança e disse para si mesmo. “Desgraça é horrível, mas costuma dar boa matéria. Nosso enviado especial já deve estar escrevendo uma senhora reportagem sobre este atentado.”
Na portaria, no elevador e na redação o papo era o mesmo. O atentado em Munique. Josético sentou-se à sua mesa e chamou sua equipe de redatores. “Macacada, não esquentem a cabeça com o atentado. Neste momento nosso enviado especial em Munique está escrevendo a matéria e logo logo receberemos pelo telex. Arrumem outro tipo de notícia e não me encham o saco. Falô?.”
O tempo foi passando. Três horas da tarde, cinco, seis, sete, oito da noite e a matéria não chegava. O diretor de redação saiu de seu aquário (sala), pedindo licença ao vereador que o visitava, reclamando de uma notícia publicada pelo jornal naquele dia, e dirigiu-se ao editor de esportes Ornesto Josético.
- E aí, meu chapa, já chegou a matéria?
- Inda não, chefe. Tô esperando.
- Não dá ligar pra este enviado especial? Perguntou novamente o diretor.
- As ligações para Munique estão complicadas. Quase nada na cidade deve estar funcionando direito. Só o serviço funerário, chefe.
O diretor não desistiu
- Pô, meu! Já tentou o celular e a Internet?
- Mas chefe, estas coisas ainda não foram inventadas. Estamos em 1972.
O diretor de redação voltou para continuar a ouvir o vereador reclamante.
Vinte minutos depois, um dos redatores retira um papel do telex e chama Ornesto Josético.
- Maravilha. Chegou nossa principal matéria do dia. Viva, viva. Esquentem as máquinas. Avisem o chefe, esbravejou Josético.
O renitente e otimista editor pegou rapidamente o papel. O texto se resumia a duas únicas linhas.
“Hoje não enviarei matérias sobre os jogos olímpicos de Munique. A competição foi cancelada por 24 horas por causa de um atentado terrorista." Assinado: Enviado especial, de Munique para o jornal Verdade Seja Dita.
terça-feira, 22 de julho de 2008
Arroz cor-de-rosa
Otávio Nunes
Quase toda matéria que faço, sempre pergunto ao entrevistado se ele tem alguma historinha curiosa sobre a pauta que estamos tratando. É claro, há assuntos que não permitem historinhas curiosas. Mas se eu encontrar uma brecha, não pestanejo. Tasco-lhe a pergunta. Fui eu semana passada fazer matéria na Cetesb, em Pinheiros, sobre uma equipe de técnicos ambientais que atuam em acidentes com produtos químicos, principalmente vazamentos. Serviço pra lá de importante à população e à natureza. Papo vai, papo vem, perguntei sobre historinhas e ouvi duas. Uma delas transcrevo cá neste espaço:
- O arroz cozinhado por uma senhora da Capital sempre ficava cor-de-rosa. Os vizinhos achavam quer era macumba. Chamados para desvendar tal mistério, técnicos da Cetesb estiveram no local várias vezes. Levaram o arroz dela para ser feito em outra casa e, surpresa, ficou branco. Pegaram arroz de outro local para ser preparado no fogão dela e ficou cor-de-rosa. Analisaram a água e nada encontraram de errado. Seria realmente macumba? Praga egípcia? Ataque de ETs? Armação do coisa-ruim? Golpe do Cacciola?
Os técnicos levaram o cor-de-rosa ao Adolfo Lutz, onde descobriram que a causa da coloração era uma bactéria que existia na casa daquela senhora. Devido à falta de higiene, as paredes estavam sujas e impregnadas de Serratia Marcences, o nome da infeliz representante do mundo microbiológico. Como a dona da casa não era muito dada à limpeza, a bactéria estava em todo o ar, principalmente na cozinha.
Pois bem, em contato com o amido presente no arroz, no trigo e em outros, a Serratia (bonito nome, aliás sempre gostei de nome de microorganismos, porque são sempre sonoros) deixa o alimento cor-de-rosa. Deve ser a bactéria preferida da Hello Kitty e da Barbie.
Quase toda matéria que faço, sempre pergunto ao entrevistado se ele tem alguma historinha curiosa sobre a pauta que estamos tratando. É claro, há assuntos que não permitem historinhas curiosas. Mas se eu encontrar uma brecha, não pestanejo. Tasco-lhe a pergunta. Fui eu semana passada fazer matéria na Cetesb, em Pinheiros, sobre uma equipe de técnicos ambientais que atuam em acidentes com produtos químicos, principalmente vazamentos. Serviço pra lá de importante à população e à natureza. Papo vai, papo vem, perguntei sobre historinhas e ouvi duas. Uma delas transcrevo cá neste espaço:
- O arroz cozinhado por uma senhora da Capital sempre ficava cor-de-rosa. Os vizinhos achavam quer era macumba. Chamados para desvendar tal mistério, técnicos da Cetesb estiveram no local várias vezes. Levaram o arroz dela para ser feito em outra casa e, surpresa, ficou branco. Pegaram arroz de outro local para ser preparado no fogão dela e ficou cor-de-rosa. Analisaram a água e nada encontraram de errado. Seria realmente macumba? Praga egípcia? Ataque de ETs? Armação do coisa-ruim? Golpe do Cacciola?
Os técnicos levaram o cor-de-rosa ao Adolfo Lutz, onde descobriram que a causa da coloração era uma bactéria que existia na casa daquela senhora. Devido à falta de higiene, as paredes estavam sujas e impregnadas de Serratia Marcences, o nome da infeliz representante do mundo microbiológico. Como a dona da casa não era muito dada à limpeza, a bactéria estava em todo o ar, principalmente na cozinha.
Pois bem, em contato com o amido presente no arroz, no trigo e em outros, a Serratia (bonito nome, aliás sempre gostei de nome de microorganismos, porque são sempre sonoros) deixa o alimento cor-de-rosa. Deve ser a bactéria preferida da Hello Kitty e da Barbie.
quinta-feira, 17 de julho de 2008
Na praça
Otávio Nunes
Parei na lanchonete para tomar o café da manhã, antes de chegar ao escritório. Sou daqueles que só sentem fome uma hora depois de acordar. Enquanto punha açúcar no café com leite, reparei que na praça em frente, embaixo da marquise, um mendigo acordava e bocejava.
Sua aparência não colaborava em nada para que alguém pudesse saber seu sexo. Descobri que era mulher depois que ela pegou o espelho e começou a arrumar os cabelos embaraçados. Apesar de tudo, cabelos femininos, longos, esbranquiçados pela idade e sujos pela vida. Seus trejeitos, também de mulher. O impossível era adivinhar quantos anos tinha. Mas certamente ainda conservava o viço pela vida.
Notei seu esforço para deixar os cabelos lisos, pois ficavam enroscados no pente como se os fios estivessem amarrados uns aos outros. Após o penteado, ela pegou o batom e passou nos lábios, lentamente, como um ritual, como algo que a purificaria, que suavizaria a vida bruta que levava nas ruas.
Questionei a mim mesmo. Como é possível uma mulher naquela condição ainda se manter vaidosa? Depois, me penitenciei do preconceito. Por que não? Mesmo dormindo debaixo da marquise, vestindo trapos, comendo restos de comida dos restaurantes, vivendo de favores, perambulando pelas calçadas como peregrina da miséria, ela continuava mulher. É possível que esteja querendo ficar bonita para algum homem. Ou simplesmente satisfazendo o orgulho próprio.
Terminei rapidamente de tomar meu café e subi para o escritório. Da minha sala, olhei para baixo, através da persiana. Ela continuava lá, olhando no espelho e sorrindo para si mesma.
Eu, na minha condição de homem classe média, com curso superior, cartão de crédito, carro novo, assinante de jornal, gravata de shopping, leitor de centenas de livros pela vida, apartamento de três quartos, condomínio pago religiosamente, filhos em escola particular, bem-nutrido, pós graduado e eleitor de partido liberal, não tinha tantos motivos para sorrir. Aquela mulher, no entanto, ria, feliz, mostrando os dentes que ainda lhe restavam, com os cabelos penteados e a boca vermelha de batom.
Fechei a persiana e continuei a trabalhar. Quem sabe amanhã eu também encontre motivos para tornar minha vida mais alegre.
Parei na lanchonete para tomar o café da manhã, antes de chegar ao escritório. Sou daqueles que só sentem fome uma hora depois de acordar. Enquanto punha açúcar no café com leite, reparei que na praça em frente, embaixo da marquise, um mendigo acordava e bocejava.
Sua aparência não colaborava em nada para que alguém pudesse saber seu sexo. Descobri que era mulher depois que ela pegou o espelho e começou a arrumar os cabelos embaraçados. Apesar de tudo, cabelos femininos, longos, esbranquiçados pela idade e sujos pela vida. Seus trejeitos, também de mulher. O impossível era adivinhar quantos anos tinha. Mas certamente ainda conservava o viço pela vida.
Notei seu esforço para deixar os cabelos lisos, pois ficavam enroscados no pente como se os fios estivessem amarrados uns aos outros. Após o penteado, ela pegou o batom e passou nos lábios, lentamente, como um ritual, como algo que a purificaria, que suavizaria a vida bruta que levava nas ruas.
Questionei a mim mesmo. Como é possível uma mulher naquela condição ainda se manter vaidosa? Depois, me penitenciei do preconceito. Por que não? Mesmo dormindo debaixo da marquise, vestindo trapos, comendo restos de comida dos restaurantes, vivendo de favores, perambulando pelas calçadas como peregrina da miséria, ela continuava mulher. É possível que esteja querendo ficar bonita para algum homem. Ou simplesmente satisfazendo o orgulho próprio.
Terminei rapidamente de tomar meu café e subi para o escritório. Da minha sala, olhei para baixo, através da persiana. Ela continuava lá, olhando no espelho e sorrindo para si mesma.
Eu, na minha condição de homem classe média, com curso superior, cartão de crédito, carro novo, assinante de jornal, gravata de shopping, leitor de centenas de livros pela vida, apartamento de três quartos, condomínio pago religiosamente, filhos em escola particular, bem-nutrido, pós graduado e eleitor de partido liberal, não tinha tantos motivos para sorrir. Aquela mulher, no entanto, ria, feliz, mostrando os dentes que ainda lhe restavam, com os cabelos penteados e a boca vermelha de batom.
Fechei a persiana e continuei a trabalhar. Quem sabe amanhã eu também encontre motivos para tornar minha vida mais alegre.
quarta-feira, 16 de julho de 2008
Cada uma!
Otávio Nunes
O ser humano é capaz de proezas das mais inimagináveis possíveis. A cada dia me surpreendo mais. Tem pessoas que pensam em ardilezas curiosas, sutis e, por que não, criativas para burlar o semelhante. Dias desses soube de duas pérolas na arte de enganar. Uma li no jornal e a outra foi relatada por um amigo. As histórias são verídicas, porém os nomes, fictícios. É claro que eu aumentei aqui, buli ali, mas não desfigurei as historinhas. Vamos à primeira.
Vanila é uma daquelas garotas que gostam de arrumar novas amizades pela Internet. Pois bem. Ela começou a “conversar” com um sujeito que dizia residir no interior, mas razoavelmente próximo à Capital. Esqueci qual cidade. Ela enviava fotos, ele também. E o desejo de se conhecer crescia de ambos os lados, a cada e-mail que trocavam.
Um dia, o rapaz se decidiu. Fez o convite a Vanila, que prontamente topou. Ele disse que viria tal dia e tal hora à Capital, mas traria sua irmã junto. “Minha mana conhece melhor a rodoviária e a cidade, pois, se eu for sozinho, posso me perder”, alegou o rapaz, no e-mail.
Tudo bem. Chegou o tal dia e Vanila acordou feliz. Afinal iria conhecer o rapaz bonito e inteligente, que viria à cidade para conhecê-la. Ao chegar ao local combinado, uma lanchonete na rodoviária, uma garota estava a sua espera. Era a irmã do rapaz. “Infelizmente, ele não pôde vir, mas eu estou aqui para conhecê-la”, disse a jovem. Bem, vamos aos finalmentes.. A “irmã” armara todo o plano para tentar alguma coisa com Vanila.
Ainda bem que nossa heroína era esperta. Quando percebeu o golpe e as cantadas da pretendente, deu no pé. É isso aí, gente. Acho que depois desse passa-moleque (ou “passa-garota”) a nossa jovem vai usar a Internet com mais juízo. Ou não. Sei lá.
A segunda historinha é mais curta e grossa, porém ainda mais esdrúxula. Beleide, nossa personagem, acordou com uma preguiça de gato velho. Tinha de trabalhar, mas precisava ir ao cabeleireiro, fazer compras e outros compromissos, os quais vinha adiando fazia semanas.
Nem precisou pensar muito e bateu a porta de seu vizinho, profissional colocador de gesso. É isso mesmo, gente. Beleide engessou o braço para não ir trabalhar. Não me perguntem os detalhes, como médico, atestado, quantos dias ficou enfaixada, que não sei. Só espero que o chefe dela note pela falta. Caso contrário, se ele não perceber...
O ser humano é capaz de proezas das mais inimagináveis possíveis. A cada dia me surpreendo mais. Tem pessoas que pensam em ardilezas curiosas, sutis e, por que não, criativas para burlar o semelhante. Dias desses soube de duas pérolas na arte de enganar. Uma li no jornal e a outra foi relatada por um amigo. As histórias são verídicas, porém os nomes, fictícios. É claro que eu aumentei aqui, buli ali, mas não desfigurei as historinhas. Vamos à primeira.
Vanila é uma daquelas garotas que gostam de arrumar novas amizades pela Internet. Pois bem. Ela começou a “conversar” com um sujeito que dizia residir no interior, mas razoavelmente próximo à Capital. Esqueci qual cidade. Ela enviava fotos, ele também. E o desejo de se conhecer crescia de ambos os lados, a cada e-mail que trocavam.
Um dia, o rapaz se decidiu. Fez o convite a Vanila, que prontamente topou. Ele disse que viria tal dia e tal hora à Capital, mas traria sua irmã junto. “Minha mana conhece melhor a rodoviária e a cidade, pois, se eu for sozinho, posso me perder”, alegou o rapaz, no e-mail.
Tudo bem. Chegou o tal dia e Vanila acordou feliz. Afinal iria conhecer o rapaz bonito e inteligente, que viria à cidade para conhecê-la. Ao chegar ao local combinado, uma lanchonete na rodoviária, uma garota estava a sua espera. Era a irmã do rapaz. “Infelizmente, ele não pôde vir, mas eu estou aqui para conhecê-la”, disse a jovem. Bem, vamos aos finalmentes.. A “irmã” armara todo o plano para tentar alguma coisa com Vanila.
Ainda bem que nossa heroína era esperta. Quando percebeu o golpe e as cantadas da pretendente, deu no pé. É isso aí, gente. Acho que depois desse passa-moleque (ou “passa-garota”) a nossa jovem vai usar a Internet com mais juízo. Ou não. Sei lá.
A segunda historinha é mais curta e grossa, porém ainda mais esdrúxula. Beleide, nossa personagem, acordou com uma preguiça de gato velho. Tinha de trabalhar, mas precisava ir ao cabeleireiro, fazer compras e outros compromissos, os quais vinha adiando fazia semanas.
Nem precisou pensar muito e bateu a porta de seu vizinho, profissional colocador de gesso. É isso mesmo, gente. Beleide engessou o braço para não ir trabalhar. Não me perguntem os detalhes, como médico, atestado, quantos dias ficou enfaixada, que não sei. Só espero que o chefe dela note pela falta. Caso contrário, se ele não perceber...
terça-feira, 15 de julho de 2008
O bur(r)ocrata
Otávio Nunes
Planílio chegou cedo à sua sala, antes mesmo da secretária. Sentia-se preocupado. Mesmo assim ligou o computador e passou a analisar os relatórios de produção. Notou que havia seções e pessoas que não acompanhavam o ritmo geral da empresa. Era necessário mudar o processo, trocar empregados de cargos, demitir outros.
Novamente, sentiu algo estranho na cabeça, sem entender o que ocorria. Sempre fora profissional ativo, ambicioso, audacioso. Jamais tivera problemas de escrúpulos ao mandar empregados embora, transferi-los de um local para outro, sugerir o corte do cafezinho ou mesmo a compra de um papel higiênico de qualidade inferior. Valia tudo para reduzir os custos e aumentar a produção. Seus patrões elogiavam suas decisões na empresa.
No último ano, reduzira o quadro de funcionários em 30%. Os que ficaram faziam o trabalho de dois ou três. Era comum seus subordinados deixar o serviço tarde da noite, exaustos. Ele, Planílio, também dava seu sangue em prol da produção e da qualidade do que ali se fabricava. Dormia tarde da madrugada e acordava cedo, ávido por chegar ao escritório e analisar os relatórios.
Sabia de tudo. Conhecia os atrasos dos empregados, suas idas ao banheiro, formação de rodinhas de papo durante o expediente. Analisava seus relatórios de modo frio. Se o funcionário estava gripado e produzia menos, pouco se lhe dava. Se o sujeito tinha se separado da mulher, não lhe interessava.
Raramente descia ao chão de fábrica para ver os funcionários produzir. “Enxergava” tudo isso nos relatórios. Para que ver a fábrica, se os números lhe bastavam. Mexia pessoas e equipamentos de dentro de sua sala, sempre baseado em seus relatórios.
Foi até a janela e respirou fundo, como se sentisse falta de oxigênio. Não conseguia entender porque estava daquele jeito. Fechou os olhos na tentativa de entender o motivo de tanta angústia. Pela sua mente passaram máquinas, dinheiro, automóveis, homens e mulheres correndo para lá e para cá a gritar “pare de mexer com nossas vidas como se fôssemos números”.
Planílio não se conteve. O desespero foi tamanho que ele saltou da janela, do oitavo andar do prédio da companhia. Por ser burocrata, levou quinze dias para chegar ao solo e outros trinta para morrer.
Planílio chegou cedo à sua sala, antes mesmo da secretária. Sentia-se preocupado. Mesmo assim ligou o computador e passou a analisar os relatórios de produção. Notou que havia seções e pessoas que não acompanhavam o ritmo geral da empresa. Era necessário mudar o processo, trocar empregados de cargos, demitir outros.
Novamente, sentiu algo estranho na cabeça, sem entender o que ocorria. Sempre fora profissional ativo, ambicioso, audacioso. Jamais tivera problemas de escrúpulos ao mandar empregados embora, transferi-los de um local para outro, sugerir o corte do cafezinho ou mesmo a compra de um papel higiênico de qualidade inferior. Valia tudo para reduzir os custos e aumentar a produção. Seus patrões elogiavam suas decisões na empresa.
No último ano, reduzira o quadro de funcionários em 30%. Os que ficaram faziam o trabalho de dois ou três. Era comum seus subordinados deixar o serviço tarde da noite, exaustos. Ele, Planílio, também dava seu sangue em prol da produção e da qualidade do que ali se fabricava. Dormia tarde da madrugada e acordava cedo, ávido por chegar ao escritório e analisar os relatórios.
Sabia de tudo. Conhecia os atrasos dos empregados, suas idas ao banheiro, formação de rodinhas de papo durante o expediente. Analisava seus relatórios de modo frio. Se o funcionário estava gripado e produzia menos, pouco se lhe dava. Se o sujeito tinha se separado da mulher, não lhe interessava.
Raramente descia ao chão de fábrica para ver os funcionários produzir. “Enxergava” tudo isso nos relatórios. Para que ver a fábrica, se os números lhe bastavam. Mexia pessoas e equipamentos de dentro de sua sala, sempre baseado em seus relatórios.
Foi até a janela e respirou fundo, como se sentisse falta de oxigênio. Não conseguia entender porque estava daquele jeito. Fechou os olhos na tentativa de entender o motivo de tanta angústia. Pela sua mente passaram máquinas, dinheiro, automóveis, homens e mulheres correndo para lá e para cá a gritar “pare de mexer com nossas vidas como se fôssemos números”.
Planílio não se conteve. O desespero foi tamanho que ele saltou da janela, do oitavo andar do prédio da companhia. Por ser burocrata, levou quinze dias para chegar ao solo e outros trinta para morrer.
segunda-feira, 14 de julho de 2008
O fim da picada
Otávio Nunes
O escorpião chegou à recepção do hospital dos insetos e assemelhados e solicitou atendimento. Mas tomou um chá de cadeira até ser recebido pelo médico. Na sua frente, ainda esperavam vez a pulga com dor nas pernas, a centopéia com um pé machucado, o vaga-lume que tinha perdido a luminosidade, a taturana com irritação na pele, um louva-deus que sofria sérios problemas de obesidade e que estava quase perdendo a fé e finalmente a abelha diabética. “Esta última deve ser o caso mais complicado, coitada!!”, raciocinou o escorpião.
Depois de horas, enquanto lia a fábula da formiga e da cigarra, o escorpião foi chamado pela joaninha, a recepcionista do médico, que usava vestido preto cheio de bolinhas amarelas. Ele entrou no consultório e foi atendido pelo doutor besouro, que lhe perguntou, mantendo certa distância.
- O que você sente meu caro escorpião?
- Não tenho nenhum problema de saúde doutor, apenas de ordem existencial. Quero que o senhor ampute meu ferrão, pois cansei de causar problemas para os outros.
- Mas, meu amigo, que pedido mais estranho. Isto é o fim da picada.
O escorpião chegou à recepção do hospital dos insetos e assemelhados e solicitou atendimento. Mas tomou um chá de cadeira até ser recebido pelo médico. Na sua frente, ainda esperavam vez a pulga com dor nas pernas, a centopéia com um pé machucado, o vaga-lume que tinha perdido a luminosidade, a taturana com irritação na pele, um louva-deus que sofria sérios problemas de obesidade e que estava quase perdendo a fé e finalmente a abelha diabética. “Esta última deve ser o caso mais complicado, coitada!!”, raciocinou o escorpião.
Depois de horas, enquanto lia a fábula da formiga e da cigarra, o escorpião foi chamado pela joaninha, a recepcionista do médico, que usava vestido preto cheio de bolinhas amarelas. Ele entrou no consultório e foi atendido pelo doutor besouro, que lhe perguntou, mantendo certa distância.
- O que você sente meu caro escorpião?
- Não tenho nenhum problema de saúde doutor, apenas de ordem existencial. Quero que o senhor ampute meu ferrão, pois cansei de causar problemas para os outros.
- Mas, meu amigo, que pedido mais estranho. Isto é o fim da picada.
quinta-feira, 10 de julho de 2008
Isto que é talento
Otávio Nunes
- Meu amigo, veja você como o talento pode brotar de repente mesmo num terreno infértil e arenoso. Conheço um jovem do interior que jamais tinha posto os pés num teatro. Numa breve visita à minha casa, cá na capital, levei-o para assistir a uma peça de Bertolt Brecht. O rapaz se encantou. Algo dentro de si acendeu, como um facho de luz nas trevas. Hoje, ele é um ator famoso, supercompetente, premiado e de renome internacional. Insigne amigo, você já presenciou algo desta natureza, uma alma que se achou e escapou do inferno da mediocridade?
- Sim, meu chapa. Tenho um primo, também do interior, que certa vez veio me visitar aqui na capital e foi assaltado na rua. O fato marcou ele pra sempre e hoje o danado é o mais famoso e procurado ladrão do país.
- Meu amigo, veja você como o talento pode brotar de repente mesmo num terreno infértil e arenoso. Conheço um jovem do interior que jamais tinha posto os pés num teatro. Numa breve visita à minha casa, cá na capital, levei-o para assistir a uma peça de Bertolt Brecht. O rapaz se encantou. Algo dentro de si acendeu, como um facho de luz nas trevas. Hoje, ele é um ator famoso, supercompetente, premiado e de renome internacional. Insigne amigo, você já presenciou algo desta natureza, uma alma que se achou e escapou do inferno da mediocridade?
- Sim, meu chapa. Tenho um primo, também do interior, que certa vez veio me visitar aqui na capital e foi assaltado na rua. O fato marcou ele pra sempre e hoje o danado é o mais famoso e procurado ladrão do país.
De vorta
Depois de um longo e telebroso outono, estou de volta. Espero não ser mais surpreendido pelos reveses da vida e assim continuar a colocar textos em meu blog. Muito obrigado. Otávio Nunes
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