Otávio Nunes
Um cavalo aproximou-se da égua Vitória, que pastava serenamente do outro lado da cerca, escolhendo os ramos mais verdinhos do capim. Um breve relincho de macho fez com que ela levantasse a cabeça. Ao ver o garanhão, abanou cortesmente sua cauda peluda. Como a porteira entre as duas fazendas estava aberta, o que era raro, Vitória juntou-se ao amigo e saíram ambos trotando calmamente, andaram tanto que até chegaram ao centro da pequena cidade de Beiradinha, cortada pelo Rio Dorminhoco. O rio tem este nome por que suas águas se movimentam lentamente. Diz a lenda local que quem o olha muito sente sono.
Minutos depois, apareceu um funcionário da prefeitura e espantou os bichos. O cavalo correu. Vitória, não. Como estava com um corda no pescoço, foi fácil ao funcionário puxá-la e levá-la ao galpão da prefeitura.
O novo prefeito, ansioso por aumentar a arrecadação do município, para construir uma terceira ponte sobre o Dorminhoco, conseguiu aprovar na câmara uma lei que proibia a circulação de animais no perímetro urbano de Beiradinha. Muitos o aconselharam da impopularidade de tal medida.
Era uma questão cultural, trazida e curtida pelos anos, de que os animais sempre perambularam pelas ruas sem que jamais alguém achasse aquilo estranho. Qualquer bicho ali sempre fora tratado como vaca nas ruas de Nova Déli ou Bombaim, na Índia.
Mas o imposto foi aprovado e estava vigorando. Como bicho não costuma ter dinheiro no bolso, nem o canguru, que tem bolso, o dono do animal seria obrigado a pagar a taxa.
Assim que Dona Branca foi avisada, saiu correndo em direção à prefeitura. Em seu gabinete, o alcaide lhe disse que teria de pagar a taxa para levar Vitória de volta. A fazendeira lembrou que jamais sua égua havia deixado a propriedade.
“Sou uma pessoa responsável, sempre cuidei bem de meus animais e pago certinho todos os impostos. Não é justo pagar para retirar minha égua do galpão municipal”, suplicou Dona Branca. O prefeito insistiu na cobrança.
A senhora entrou no galpão e viu Vitória feliz da vida, balançando a cauda e a cabeça diversas vezes, ao reconhecer a dona. Puxou a égua pela corda e a retirou do depósito. Ao ver a mulher e a égua, já na rua, o prefeito exigiu novamente o pagamento da taxa.
- Não vou pagar coisa alguma. Se for homem, venha me prender. Né, Vitória?
E as duas voltaram felizes para casa, cantarolando e relinchando.
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